O conceito de populismo é frequentemente entendido como uma divisão entre os “maus”, representados pela elite, e os “bons”, que são o povo. Uma definição mais aprofundada sugere que o populismo surge para preencher os “desvios de representação política”, ou seja, as discrepâncias entre as políticas dos partidos estabelecidos e a vontade popular.
Um estudo recente do economista Laurenz Guenther, mencionado por John Burn-Murdoch no “Financial Times” de 26 de setembro, analisa esta questão sob duas vertentes: as questões económicas e culturais, abrangendo a maioria dos países da União Europeia. Os resultados, embora interessantes, não são surpreendentes.
Na esfera económica, observa-se um alinhamento razoável entre os políticos e o eleitorado em temas como a redistribuição de riqueza e a dicotomia entre socialismo e capitalismo. No entanto, nas questões culturais, as divergências são profundas e abrangem todos os grupos sociais. O eleitorado revela-se, em geral, mais conservador do que os políticos que deveriam representá-lo.
Por exemplo, quando questionados sobre a adaptação dos imigrantes aos costumes do país, 75% dos eleitores alemães concordam, enquanto apenas 33% dos políticos partilham dessa opinião. Em Portugal, a discrepância é ainda mais acentuada: 72% dos eleitores apoiam essa ideia, mas apenas 18% dos políticos a aceitam.
Guenther conclui que este desvio de representação cultural é um fenómeno sistemático que se manifesta em quatro aspectos principais: i) está presente em quase todas as questões culturais; ii) ocorre em quase todos os países da UE; iii) os partidos estabelecidos tendem a ser culturalmente mais “liberais” do que o eleitorado médio; iv) todos os principais grupos demográficos tendem a ser mais conservadores do que os seus representantes.
Entre 2009 e 2022, a votação em partidos populistas aumentou significativamente na UE, apesar de não ter havido uma alteração substancial nas preferências do eleitorado ou nas posições dos partidos. A principal diferença reside no crescente peso que o eleitorado atribui às questões culturais.
De acordo com este estudo, o aumento da influência dos partidos populistas deve-se, em parte, ao desfasamento entre as opiniões dos eleitores e as dos políticos, e, por outro lado, à crescente valorização das questões culturais.
Para os partidos em Portugal que desejam alcançar sucesso eleitoral, será crucial adotar posturas mais conservadoras, alinhadas com as opiniões do eleitorado. Uma questão pertinente que se coloca é a seguinte: é preferível deixar a questão da imigração nas mãos de um partido xenófobo ou optar por uma abordagem mais humanista pelo seu próprio partido?
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Fonte: Sapo