Nos últimos meses, o debate sobre a inteligência artificial (IA) tem ganho destaque em Portugal, refletindo preocupações sobre as mudanças profundas que estas tecnologias estão a provocar no trabalho, na educação e na produção de conhecimento. Este tema surge num contexto de iniciativas internacionais que visam avaliar o desempenho da IA em áreas tradicionalmente reservadas a especialistas humanos.
Um dos projetos mais relevantes é o Humanity’s Last Exam, desenvolvido pelo Center for AI Safety, uma organização norte-americana dedicada à avaliação independente do progresso da IA. O objetivo deste projeto é testar a capacidade de modelos generalistas em superar humanos em áreas técnicas e científicas. Para isso, foi lançado um apelo à comunidade científica e técnica, convidando especialistas a submeter perguntas complexas representativas do seu trabalho. Estas questões foram posteriormente respondidas por grupos humanos e por modelos de última geração, como o GPT-4o e o Claude 3.5 Sonnet.
A iniciativa surgiu da constatação de que muitos conjuntos de dados usados para avaliar modelos de linguagem já não representam um desafio real, uma vez que sistemas recentes alcançam mais de 90% de sucesso em testes que antes eram exigentes. Para criar uma nova métrica de dificuldade, foi lançado um desafio aberto à comunidade científica, ao qual responderam mais de mil especialistas de todo o mundo. Deste esforço, foram selecionadas 2.500 perguntas originais, abrangendo diversas áreas do conhecimento, todas revistas rigorosamente para garantir precisão e clareza.
Essas perguntas exigiam conhecimentos ao nível de mestrado ou doutoramento, um patamar que menos de 1% da população mundial atinge. No momento da publicação, o desempenho máximo de qualquer modelo rondava os 20% de acerto. Seis meses depois, novos sistemas como o Grok-4 e o GPT-5 atingiram cerca de 25%, demonstrando que este exame funciona como uma régua sensível de progresso.
Investigadores do INESC-MN participaram no projeto, contribuindo com perguntas nas áreas da eletrónica, física e fotónica. Sete das suas perguntas foram aceites, evidenciando o grau de dificuldade envolvido. Muitas questões, concebidas para exigir raciocínio especializado, foram respondidas corretamente pelos modelos, revelando a sua maturidade técnica e a rapidez da sua evolução.
Esta realidade levanta uma questão central: como deve a sociedade posicionar-se perante um futuro em que a IA já supera a maioria dos indivíduos em tarefas complexas? Especialistas defendem que o valor humano deverá residir na compreensão profunda dos fundamentos científicos e na supervisão responsável de sistemas tecnológicos avançados. Para estudantes e jovens profissionais, isso pode significar a necessidade de investir mais em competências de integração e pensamento crítico, em vez de se focarem exclusivamente em tarefas técnicas que podem ser rapidamente automatizadas.
A forma como se distribuem os investimentos em formação será determinante. Se a IA já supera muitos humanos na execução de tarefas técnicas, o valor acrescentado passará para competências que permitam estruturar problemas e integrar áreas de conhecimento. Para empresas e governos, isso traduz-se numa mudança de foco, com menos ênfase na transmissão de competências técnicas e mais na criação de perfis capazes de liderar e contextualizar tecnologias avançadas.
O Humanity’s Last Exam evidencia que entrámos numa nova fase de relação entre humanos e máquinas. A inteligência artificial promete ampliar a criatividade e acelerar descobertas, mas também levanta riscos, ao deslocar funções humanas centrais. Para países como Portugal, este cenário representa um desafio e uma oportunidade. A rapidez da transformação tecnológica exige que universidades, empresas e decisores políticos repensem prioridades de formação e investimento, posicionando talento e inovação num contexto global em rápida mutação. O futuro dependerá da forma como a sociedade escolher integrar este poder nos seus sistemas económicos e sociais.
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Fonte: ECO





