O ouro voltou a ser tema de destaque em 2023, com os preços a atingirem novos máximos históricos. Este aumento é impulsionado por uma combinação de fatores, incluindo a incerteza geopolítica, a desaceleração económica, o regresso da inflação e a diminuição da importância do dólar na economia global. A crença de que o ouro é um refúgio seguro em tempos de crise é uma narrativa poderosa, mas enganadora. Na realidade, o ouro pode ser visto como a mais longa e persistente bolha especulativa da história económica.
A ideia de que o ouro protege contra a inflação não é suportada por dados. Entre 1980 e 2000, o preço do ouro caiu mais de 40% em termos reais, enquanto a inflação acumulada ultrapassou os 120%. Aqueles que confiaram no poder do ouro para preservar o seu poder de compra acabaram por perder. Estudos demonstram que a relação entre o preço do ouro e a inflação é, na melhor das hipóteses, errática. O ouro tende a valorizar-se em tempos de medo, não necessariamente em resposta à inflação, o que o torna um ativo emocional, mais do que económico.
Além disso, a noção de que o ouro é uma “reserva de valor” também não resiste a uma análise mais profunda. Desde que Nixon aboliu a conversibilidade do dólar em ouro, em 1971, o metal valorizou cerca de dez vezes, enquanto o índice global de ações (MSCI World) multiplicou-se por mais de oitenta. O ouro não gera fluxos de caixa, dividendos ou juros, o que o torna um ativo de retorno nulo. O seu preço depende unicamente do que o próximo comprador está disposto a pagar, revelando-se mais como um símbolo de escassez do que um verdadeiro valor.
Warren Buffett já ironizou a situação, afirmando que escavamos o ouro, derretemos e enterramos novamente, pagando alguém para o guardar. O custo de oportunidade é elevado, pois enquanto o capital produtivo gera riqueza, o ouro apenas ocupa espaço em cofres. O seu valor real está muito próximo do custo de extração, estimado entre 1.200 e 1.400 dólares por onça. O que se paga acima disso é, na verdade, especulação alimentada por narrativas de medo.
O professor Aswath Damodaran também partilha uma visão cética sobre o ouro. Sem gerar fluxos de caixa, o metal não possui valor intrínseco que possa ser avaliado. Investir em ouro é, essencialmente, participar num jogo de preços, não numa avaliação de valor. Essa escolha implica um custo de oportunidade em relação a ativos que oferecem rendimento, como depósitos ou ações.
A recente compra de ouro por bancos centrais, como os da China, Rússia e Turquia, tem sido impulsionada por razões políticas, não económicas. Embora essas aquisições possam reforçar o preço do ouro, também tornam esses bancos prisioneiros de uma bolha que ajudam a inflacionar. O ouro, neste contexto, serve mais como um símbolo de resistência à hegemonia monetária ocidental do que como um verdadeiro ativo de reserva.
Politicamente, o ouro passou a ter novas funções, sendo utilizado por governos para sinalizar autonomia e desdolarização. Essa procura oficial pode alimentar a subida de preços, mas também pode inverter-se rapidamente quando a necessidade de liquidez se torna urgente. O ouro, portanto, não é apenas um ativo, mas um símbolo político que alimenta a bolha.
Em última análise, o ouro representa a fé de quem desconfia de governos e instituições financeiras. No entanto, essa fé não deve ser confundida com uma estratégia de investimento sólida. A valorização recente do ouro reflete mais a fragilidade da confiança global do que a sua utilidade económica. O ouro é um termómetro do medo, não um barómetro do valor. Quando a ansiedade diminui, o seu preço tende a corrigir-se.
A verdadeira proteção contra a inflação e a incerteza reside na produtividade, inovação e capital humano. O risco geopolítico é mitigado por instituições sólidas e boa governação, não por barras de metal. O ouro pode continuar a atrair aqueles que confundem escassez com valor, mas a experiência mostra que o futuro não se constrói olhando para cofres. O ouro é, assim, uma bolha especulativa que reflete a nossa insegurança, não a nossa racionalidade.
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Fonte: ECO





