Num contexto de incertezas globais e rápidas inovações tecnológicas, Portugal enfrenta um desafio crucial: decidir entre permanecer numa posição periférica ou aproveitar os investimentos na indústria de defesa para promover a reindustrialização e, ao mesmo tempo, unir o país. Este setor, que há muito deixou de ser apenas um suporte para as Forças Armadas, transformou-se num polo de inovação e tecnologia, capaz de gerar emprego qualificado e atrair investimento externo, contribuindo para reduzir a histórica divisão entre o litoral e o interior.
Atualmente, a indústria de defesa em Portugal conta com mais de 380 empresas e gera mais de 40 mil empregos diretos. Este ecossistema diversificado abrange áreas como aeronáutica, sistemas navais, cibersegurança e inteligência artificial. Empresas como OGMA, Embraer Portugal e Thales estão a posicionar Portugal como um centro competitivo em tecnologia dual, com um impacto positivo em toda a economia nacional.
O setor apresenta um crescimento significativo, representando já mais de 1,6% do PIB, com uma faturação anual que ronda os 4,75 mil milhões de euros e cerca de 2% das exportações nacionais. A maioria das empresas atua como prestadores de serviços, enquanto uma parte considerável tem uma matriz industrial direta, permitindo que a cadeia de valor se estenda a diversos setores, desde o fabrico de equipamentos até ao desenvolvimento de soluções digitais.
A forte orientação para a exportação e a integração em cadeias globais, aliadas a programas como o Fundo Europeu de Defesa, favorecem o financiamento e a inovação. Este ambiente propício não só beneficia as empresas de alta tecnologia, mas também potencia indústrias tradicionais, como o têxtil técnico e o calçado tático, especialmente em regiões menos urbanizadas.
Clusters em locais como Aveiro e Braga demonstram que é possível inovar e exportar valor a partir do interior do país. Ao investir em centros de I&D ligados a instituições de ensino, Portugal tem a oportunidade de inverter a desertificação e revitalizar comunidades. Para que este objetivo se concretize, são necessárias medidas concretas, como a criação de zonas industriais com benefícios fiscais e protocolos entre universidades e empresas.
Investir na indústria de defesa não significa apenas desenvolver fábricas e centros de investigação, mas também fortalecer a rede local de PME e fornecedores, criando oportunidades para trabalhadores qualificados. A reindustrialização através da defesa deve transformar despesas em investimentos sustentáveis, priorizando a produção nacional e envolvendo o tecido empresarial do interior, evitando a concentração em Lisboa.
Além disso, é fundamental estimular contratos que promovam a sustentabilidade. A indústria de defesa portuguesa tem potencial para liderar na descarbonização e na utilização de materiais ecológicos, tornando-se um exemplo de inovação responsável.
Para alcançar este potencial transformador, é necessária uma coordenação eficaz entre os setores da Defesa, Economia e Ciência, além de um compromisso político que transcenda os ciclos governativos. Políticas fragmentadas podem perpetuar desigualdades regionais, enquanto uma abordagem integrada pode garantir que todas as regiões beneficiem igualmente.
Diante da pressão europeia para aumentar a autonomia estratégica, Portugal deve afirmar-se como um produtor de tecnologia e conhecimento, não apenas como consumidor. O país já possui um ecossistema de I&D robusto, mas é crucial implementar incentivos e políticas de continuidade que transformem este potencial em prosperidade.
Reindustrializar Portugal através da indústria de defesa é a chave para criar valor partilhado e permitir que todas as regiões do país possam competir e prosperar. Para os decisores políticos, esta é uma oportunidade histórica que não pode ser ignorada, sob pena de perpetuar um futuro desigual.
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Fonte: Sapo





