Todos os anos, com a chegada de novembro, as marcas entram numa frenética corrida comunicacional. A Black Friday torna-se um megafone descontrolado, onde tudo é urgência, tudo é desconto e tudo é uma “última oportunidade”. Independentemente do seu tamanho ou propósito, desde startups sustentáveis a pequenos negócios locais, todas adotam uma linguagem semelhante, perdendo a sua identidade no processo.
Este fenómeno não se limita apenas às marcas. Influenciadores e criadores de conteúdo também se juntam a este coro ensurdecedor. O feed das redes sociais transforma-se numa competição para ver quem consegue gritar mais alto sobre promoções. Com tanta informação, o que deveria ser útil torna-se apenas ruído, sem propósito.
Por trás deste cenário, esconde-se uma realidade mais profunda. O capitalismo moldou-nos para acreditar que precisamos de consumir incessantemente, acumulando bens que muitas vezes não são essenciais. Este ciclo vicioso oferece pequenas injeções de dopamina, aliviando a exaustão que resulta do trabalho constante. Ironia das ironias, muitos dos problemas que tentamos resolver com compras são, na verdade, criados pelo próprio sistema que nos vende as soluções.
A Black Friday intensifica este ciclo. A origem do termo é debatida, podendo estar ligada a eventos históricos como o crash de Wall Street ou ao início das compras de Natal. Independentemente da versão, o resultado é claro: a Black Friday tornou-se uma celebração global do consumismo, onde marcas e consumidores sentem a pressão de participar.
Para as marcas, a Black Friday é uma oportunidade de ouro. Contudo, para os consumidores, nem sempre resulta no jackpot esperado. É fundamental parar e refletir sobre o que realmente é necessário. Quantos produtos no carrinho são realmente úteis? Quantos foram adicionados apenas porque o preço caiu drasticamente? Muitas vezes, os descontos são ilusórios, com preços que aumentam antes da Black Friday para parecerem mais atrativos. Este comportamento resulta numa quantidade excessiva de lixo gerado em apenas dois dias, enquanto os consumidores acreditam estar a aproveitar uma grande oportunidade.
Além disso, muitas marcas que comunicam com cuidado e rigor durante o ano acabam por ceder a uma linguagem que não lhes pertence, apenas para não ficarem de fora. Este fenómeno é visível em outras efemérides, como o Pride Month ou o Dia da Mulher, onde marcas que nunca abordaram esses temas tentam alinhar-se com a tendência, mas sem autenticidade.
Quando todas as marcas comunicam da mesma forma, ninguém se destaca. Trocar a identidade por uma linguagem genérica para não perder a oportunidade de vendas resulta em perda de credibilidade e reconhecimento. No final, o que realmente importa é que tanto marcas quanto consumidores reflitam sobre onde investem o seu dinheiro, tempo e intenção. Cada decisão tem um impacto real, mesmo que muitas vezes não o reconheçamos.
É crucial que as marcas compreendam que vender a qualquer custo não é uma estratégia sustentável. A identidade de uma marca não deve ser um acessório que se abandona em momentos convenientes. Uma marca que sabe quem é não precisa de gritar para ser ouvida, assim como um consumidor que sabe o que quer não deve correr atrás de descontos como se fossem bússolas.
Talvez o verdadeiro significado da Black Friday resida na oportunidade de escolher com consciência, em vez de se deixar levar por impulsos consumistas.
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Fonte: ECO





