A boa governação nas empresas é um tema que, apesar de ser frequentemente abordado em relatórios e discussões académicas, ainda é tratado como um mero acessório nas práticas empresariais em Portugal. Na realidade, a boa governação é um elemento fundamental para o desempenho, a escalabilidade e o crescimento económico das organizações.
Nos documentos de soft law e nos think-tanks, o papel do corporate governance é amplamente reconhecido. No entanto, existe uma lacuna significativa na sua implementação prática, que levanta questões sobre a qualidade ética do poder económico no país. A narrativa predominante tende a apresentar a boa governação como um conjunto neutro de boas práticas e normas de compliance, mas esta visão é demasiado simplista. A forma como se decide e quem toma as decisões nas empresas têm implicações profundas, tornando a boa governação não apenas um manual de procedimentos, mas uma verdadeira arquitetura de interesses.
O Código das Sociedades Comerciais em Portugal já reflete uma tendência para a consagração de deveres legais que vão além do lucro imediato, embora essa mudança ocorra de forma tímida e sob pressão da legislação europeia. Contudo, a dicotomia entre o cumprimento das normas e a cultura empresarial continua a ser um desafio. Muitas empresas podem ter administradores independentes ou políticas de contratação que valorizam o longo prazo, mas isso não é suficiente. O que realmente importa é a adoção de uma ética fiduciária genuína.
Infelizmente, muitos ainda encaram os cargos de liderança como um símbolo de status, em vez de uma responsabilidade. A boa governação exige mais do que relatórios bem elaborados; requer coragem. Coragem para recusar decisões que possam comprometer o futuro da empresa em favor de interesses imediatos. Coragem para integrar fatores ambientais e sociais como componentes estratégicos, e não apenas como elementos de marketing. Coragem para compreender que o valor de uma empresa não se mede apenas em números, mas também na confiança que constrói ao longo do tempo.
A confiança, atualmente, é um dos ativos mais escassos nos mercados globais e não pode ser comprada. É algo que se constrói com tempo, paciência, coerência, integridade e transparência. Uma empresa que ignora as boas práticas de governação, mesmo apresentando resultados financeiros robustos, será sempre vulnerável. Um sistema económico que normaliza essas fragilidades compromete a sua própria credibilidade.
Para que as economias sejam robustas, é imprescindível que as empresas sejam igualmente fortes e modernas. Modernidade implica discrição, consistência e responsabilidade. A boa governação corporativa é o espaço onde as métricas se subordinam a valores que têm um peso muito superior a qualquer balanço financeiro.
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Fonte: Sapo





